Um estudo recente, elaborado por pesquisadores das universidades College London (UCL), no Reino Unido, e Medical Centre Göttingen, na Alemanha, demonstrou que pessoas que receberam diagnóstico de ansiedade após os 50 anos têm risco dobrado de serem diagnosticadas com Doença de Parkinson posteriormente.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores analisaram dados de saúde de quase 1 milhão de pacientes atendidos na atenção primária do Reino Unido. Desse total, 109.435 desenvolveram ansiedade após os 50 anos e 878.256 não apresentavam o transtorno e foram tratados no estudo como grupo controle.
Ao longo da pesquisa, publicada no final de junho no periódico científico British Journal of General Practice, os cientistas investigaram a presença de características da doença de Parkinson, como problemas de sono, depressão, tremores e desequilíbrio, desde o diagnóstico de ansiedade até um ano antes da data do diagnóstico de Parkinson.
A equipe ajustou os resultados levando em conta questões como idade, sexo, privação social, estilo de vida, histórico de doença mental grave, traumatismo craniano e demência, fatores que podem influenciar a probabilidade de desenvolvimento da doença em pessoas com ansiedade.
Assim, eles descobriram que o risco de desenvolver Parkinson dobrou em pessoas com ansiedade, em comparação ao grupo de controle. Segundo a pesquisa, o tempo mediano para o diagnóstico de Parkinson após o primeiro episódio registrado de ansiedade entre o grupo analisado foi de 4,9 anos. Daqueles que tinham ansiedade, 331 desenvolveram a doença durante o período de acompanhamento.
Os cientistas também confirmaram que, em pessoas com ansiedade, sintomas como depressão, distúrbios do sono, fadiga, comprometimento cognitivo, hipotensão, tremor, rigidez, comprometimento do equilíbrio e constipação também são fatores de risco para o desenvolvimento de Parkinson.
Um sinal precoce
“Sabe-se que a ansiedade é uma característica dos estágios iniciais da doença de Parkinson, mas, antes do nosso estudo, o risco potencial de Parkinson em pessoas com mais de 50 anos com ansiedade de início recente era desconhecido”, explicou o coautor do estudo Juan Bazo Alvarez, em comunicado da UCL.
O neurologista Thiago Vale, professor e membro do Núcleo de Pesquisa em Neurologia (NPN) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), explica que a ansiedade está presente em cerca de 30% dos pacientes com Parkinson na fase inicial – antes das manifestações motoras, como tremor e lentidão – e em até 50% de todos os casos. O novo estudo abre um caminho para estudar a ansiedade não só como sintoma precoce do Parkinson, mas também como fator de risco para a doença.
Além disso, segundo Alvarez, ao entender que a ansiedade e as características mencionadas estão ligadas a um risco maior de desenvolver a doença de Parkinson após os 50 anos, a expectativa é que seja possível detectar a condição mais cedo e ajudar os pacientes a obter o tratamento o quanto antes.
Ivani Brys, especialista em psicobiologia e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Neurociências e Psicologia Experimental (Neurovale) da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), corrobora a importância do estudo para vencer o desafio da identificação precoce da Doença de Parkinson. Ela ressalta que os sintomas clássicos da doença, como tremores e rigidez muscular, geralmente só se manifestam quando cerca de 60% dos neurônios dopaminérgicos já foram perdidos.
Em trabalho publicado em 2021, o grupo de pesquisas de Brys já havia demonstrado que o nível de ansiedade pode ser um fator de risco para o desenvolvimento de complicações motoras associadas ao tratamento com o medicamento levodopa, principal droga usada no tratamento do Parkinson. Agora, ela destaca que “reconhecer a ansiedade como uma característica capaz de identificar pacientes já nas fases iniciais da doença reforça a importância de uma avaliação clínica integral, que contemple também aspectos não motores”.
Resultados do estudo devem ser analisados com cautela, dizem especialistas
Os neurologistas Luciana Barbosa, do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, e Diogo Haddad, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, fazem algumas ressalvas para a análise. Os especialistas apontam que o estudo é confiável, no entanto, como foi desenvolvido com dados de registros eletrônicos de prontuários médicos do passado, e não informações coletadas especificamente para fins de pesquisa, as conclusões podem ter algumas limitações. Entre elas, Luciana cita que ainda não se sabe se os pacientes em questão possuíam transtorno de ansiedade mais severo ou leve nem o quanto ele comprometia a qualidade de vida dos participantes.
Os quatro especialistas ressaltam a expectativa por novas pesquisas que possam aprofundar a análise e aplicar esses achados à realidade de outros países.
O Parkinson afeta quase 10 milhões de pessoas em todo o mundo. Nesse sentido, os cientistas da universidade College London acreditam que pesquisas futuras devem explorar como a ocorrência precoce da ansiedade se relaciona com outros sintomas precoces e com a progressão subjacente do Parkinson em seus estágios iniciais.
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